sexta-feira, 20 de maio de 2011

Aqui, eu sei, é diferente

Da coluna de Dora Kramer, no Estadão de hoje.

UMA FOTO DO BRASIL

No dia 10 de maio, uma professora, Amada Gurgel, falou em audiência pública na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte meia dúzia de verdades que desenharam em parte o cenário da educação no País.

Às autoridades presentes restou o silêncio diante das palavras de uma brasileira angustiada.

As seguintes: "Durante cada fala aqui eu pensava em como organizar a minha fala. Porque são tantas as questões a serem colocadas e tantas as angústias do dia a dia de quem está em sala de aula, que eu queria pelo menos conseguir sintetizar minimamente essas angústias.

"Como as pessoas sempre apresentam muitos números e dizem que eles são irrefutáveis, eu gostaria também de apresentar um número que é composto por três algarismos apenas, bem diferentes de tantos números que são apresentados aqui com tantos algarismos: é o número do meu salário, R$ 930, com nível superior e especialização.

"Eu perguntaria a todos aqui, mas só respondam se não ficarem constrangidos, se vocês conseguiriam sobreviver ou manter o padrão de vida que vocês mantêm, com esse salário. Certamente não conseguiriam.

"Não é suficiente nem para pagar a indumentária que os senhores e as senhoras utilizam para poder frequentar esta Casa. A minha fala não poderia partir de um ponto diferente, porque só quem está em sala de aula, só quem pega três ônibus por dia para chegar a seu local de trabalho é que pode falar com propriedade.

"Fora disso, qualquer consideração aqui é apenas para mascarar uma verdade visível a todo mundo: em nenhum governo, em nenhum momento no nosso Estado, na nossa cidade, no nosso país a educação foi uma prioridade.

"Então, me preocupa muitíssimo a posição da maioria, inclusive da secretária (de Educação) Betânia Ramalho, de não falarmos sobre a situação precária porque isso todo mundo já sabe.

"Como assim, não vamos falar da situação precária? Gente, estamos aceitando a condição precária da educação como uma fatalidade?

"Estão me colocando dentro de uma sala de aula com um giz e um quadro para salvar o Brasil, é isso?

"Salas de aulas superlotadas com os alunos entrando com uma carteira na cabeça porque não têm carteiras nas salas e sou eu a redentora do País? Não tenho condições, muito menos com o salário que recebo.

"A secretária disse que não podemos ser imediatistas, que precisamos pensar a longo prazo. Mas a minha necessidade de alimentação é imediata. A minha necessidade de transporte é imediata, a necessidade dos alunos de ter uma educação de qualidade é imediata.

"Eu gostaria de pedir aos senhores que se libertem dessa concepção extremamente equivocada, e digo isso com mais propriedade do que os grandes estudiosos: parem de associar a qualidade da educação com professor dentro da sala de aula.

"Não há como ter qualidade em educação com professores trabalhando em três turnos seguidos, multiplicando seus salários: R$ 930 de manhã, R$ 930 de tarde, R$ 930 de noite para poder sobreviver. Não é para andar com bolsa de marca nem para usar perfume francês.

"É para pagar a alimentação de seus filhos, para pagar a prestação de um carro que muitas vezes compram para se locomover mais rapidamente entre uma escola e outra.

"Não me sinto constrangida de apresentar meu contracheque, porque penso que o constrangimento deve ser de vocês.

"Lamento, mas deveriam todos estar constrangidos. Entra governo e sai governo e o que se solicita de nós é paciência e tolerância.

"Quero pedir à secretária paciência também porque nós não aguentamos mais esse discurso.

"Não podemos ser responsabilizados pelo caos que na verdade só se apresenta para a sociedade quando nós estamos em greve, mas que está lá todos os dias dentro da sala de aula, em todos os lugares.

"São muitas questões mais complexas que precisariam ser postas aqui. Mas infelizmente o tempo é curto e é isso que eu gostaria de dizer em nome dos meus colegas que pegam três ônibus para chegar ao local de trabalho, em nome dos estudantes que estão sem aula agora por causa da greve, mas que ficam sem aula por muitos outros motivos."

É isso. Embora não seja apenas isso.


quinta-feira, 19 de maio de 2011

O Acre, afinal, é referência para o resto do Brasil


A imprensa do país inteiro aponta a porta de entrada do oxi no país. O Acre, finalmente, virou referência nacional.

sábado, 7 de maio de 2011

Bullying – tamanho não é documento...

Por Ademir Pedrosa

Havia na rua onde eu morava um molecão que aterrorizava o bairro inteiro. Aliás, o aumentativo do nome cabia-lhe como uma luva, o moleque era o cão em forma de gente. Não havia um que já não tivesse levado uma surra dele. Menos eu. Eu era o mais mirrado da turma, e todas as vezes que ele insurgia contra a gente, eu me borrava de medo, mas sempre escapava ileso, muito mais por sorte do que por habilidade.

Certo dia, eu brincava na calçada da rua quando surgiu do nada o valentão. E não ficava um, mas eventualmente ele conseguia agarrar um pobre coitado. Espavorido, eu corria que nem o papa-léguas, mas desta vez a sorte não estava do meu lado. O chinelo me escapou do pé, e voltei pra pegá-lo, quando ele me alcançou primeiro.

Ele me agarrou pelas axilas e me ergueu no alto, de frente do seu rosto. Chacoalhou-me feito um boneco desengonçado. Como eu estava gripado, tossi; e soltei um espirro impertinente, que lhe cuspi o rosto. Incontinenti, eu aproveitei a deixa para cuspir-lhe outra vez, dessa vez dissimulado, na manha.

Ele me pôs de volta ao chão, e disse: olha só, seu pirralho, o que tu fizeste! Roguei-lhe perdão. Ele disse: seu merdinha, tu não aguenta um cascudo, tenho pena de ti. Pensei que fosse me surrar, mas teve piedade. De fato, eu não aguentaria sequer um beliscão.

Ele se despiu da camisa para limpar a meleca do rosto – foi forçado usar da própria roupa, pois eu trajava somente um simples calção de chita, o que evidentemente impedia de servir-lhe de toalha. Quando ficou nu da cintura pra cima, pude verificar que o moleque era mesmo forte como um pitbull.

Seu bíceps avantajado era como de um atleta adulto. Aproximei-me, e perguntei se eu podia tocá-lo, ele assentiu com a cabeça, e eu dei três pancadas com as costas da mão em punho em seu tórax. Uma muralha, disse-lhe. Ele espraiou um sorriso incoercível.

Daí passou a se exibir, e exultava da rigidez dos músculos. Ele saltitava, socava o ar numa sequência frenética de golpes. Sacudia os ombros, e balançava a cabeça, como um pêndulo; e erguia o punho, vitorioso. Jactava-se, como se estivesse num ringue, e acabado de derrubar um pugilista imaginário.

Resolvi desafiá-lo. Está vendo aquele tronco? Duvido se tens coragem de dar uma bicuda nele. Era um tronco chamuscado que jazia na calçada. Ele não contou história, desferiu um chute certeiro que o pé, descalço, foi alojar-se no oco do tronco. Foi um sacrifício pra tirá-lo dali, e quando conseguiu se desvencilhar, o pé pingava sangue. Ao se recompor, disse: isso só dói em mariquinhas...

Era chegada a hora do golpe de misericórdia. E eu desdenhava da força dele, dizia que sua valentia era igual de qualquer um. Então eu desafiei. Queria ver se ele fazia que nem o “Cabeça de Aço”, lutador de telequete da tevê que derrotava seus adversários usando só a cabeça. Cada cabeçada era um nocaute.

Havia ali um resto de muro, ruína de um casarão abandonado. Desafiei se era capaz de dar uma cabeçada no muro. Mexi com seu brio. Provoquei-o: du-vi-de-o-dó! No mesmo instante ele tomou impulso, soltou um berro assustador, e deu uma brutal cabeçada no muro. Ouviu-se um barulho surdo e oco. Parte do muro tombou para trás, e ele sucumbiu como um fardo insustentável, desfalecido. Soergueu-se cambaleante, mas já estava nocauteado de pé. Nascera-lhe na testa um galo deste tamanho...

Quando li O Barril de Amontillado, de Allan Poe, eu compreendi que não vale nada de nadas uma vingança se o vingador não fizer com que aquele que o ofendeu compreenda que é ele quem se vinga. Daí eu tive o capricho de mostrar que era eu quem tinha lhe abatido, levado à lona – posto que eu não tivesse lhe tocado um dedo sequer.

Cheguei bem juntinho dele, e disse sussurrando: eu te quebrei o pé e a cabeça, e ainda te cuspi a cara; não te metes comigo que tu não aguentas. E saí dali sem olhar para trás, cheio de bossalidade e feliz à beça com minha traquinagem...

Postscriptum – Se você não tem a destreza de usar os dentes e as unhas, experimenta usar os neurônios. É tiro e queda, especialmente se o tico e o teco do adversário pensa que é o caralho de asa.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

É tudo uma questão de perspectiva





Imagens feitas pelo fotógrafo Dhárcules Pinheiro.