Depois de três meses de ausência, ela chega para modificar o aspecto do apartamento. Muda os móveis do lugar, decide colocar na cozinha a mesa da sala, move a geladeira para debaixo do armário de parede. Manipula os objetos com decisão, descobrindo teias de aranha e montículos de poeira antes sequer por mim imaginados.
Tanta habilidade em arrumar os móveis aumenta milagrosamente os espaços entre eles, fazendo-me crer que toda mulher tem um pouco de bruxa. (E não concluo isso apenas porque agora ela tem a vassoura entre as mãos, o que, convenhamos, seria uma piada fora de propósito).
Agora sou, pois, um menino desorientado e inútil ante tanta competência para limpar, espanar, arrumar e decidir o que deve permanecer comigo e o que tem de ir para o lixo. Obedeço sem contestação, já que o resultado que ela consegue em meia hora de trabalho me custaria talvez uma semana de cálculos e dissabores. Por isso permaneço em seus calcanhares, humildemente indagando o que devo fazer para ajudá-la.
Como estou razoavelmente bem situado em meio a minha bagunça, é com certo receio, porém, que a vejo promover tantas mudanças. Pois temo pelo destino de alguns escritos que guardo comigo menos pelo valor literário que pelo capricho de possuí-los há tantos anos. Objetos menores, como um furador de charutos e vários CDs de computador, são supervisionados como se fossem evaporar no mormaço da sala.
Mas ao final do cataclismo doméstico vejo, surpreso, que o apartamento ficou mais espaçoso e agradável. Meus objetos pessoais estão exatamente nos lugares em que deveriam estar desde que cheguei aqui. E até a luz do dia parece mais à vontade para se instalar nos aposentos.
Sou então obrigado a reconhecer que em muitos aspectos as mulheres ocupam um lugar de destaque na escala evolutiva. Pois de onde viria tanta habilidade e disposição para lidar com as coisas da casa senão dos milhares de anos de história que as credenciaram para isso?
Não devemos esquecer que enquanto nós, os homens, empregávamos a força bruta para conseguir alimento, as mulheres desenvolviam, no cuidar da caverna, o senso estético e o equilíbrio interior.
A evolução humana (ou a revolução sexual ou o movimento feminista ou seja lá o que for) inverteu essa lógica, é verdade, e aos poucos elas trocaram os afazeres domésticos pelos apetrechos de caça. Mulheres e homens agora se ombreiam do lado de fora das cavernas, na busca do alimento e em muitos casos com imensa desvantagem para os últimos.
Darwin não viveu o suficiente para constatar que elas têm maior capacidade de adaptação ao meio. Pois se saíram do aconchego (ou do claustro) doméstico para marcar sua posição no mercado de trabalho ou na política, nós ainda não nos adaptamos inteiramente às exigências do lar. Essa mudança levará talvez muito mais tempo do que as mulheres precisaram para se estabelecer na vida aqui de fora.
E isso me leva a crer que o tempo haverá de provar que nossa superioridade consiste apenas compreender a regras do futebol, beber cerveja e deixar a poeira acumular-se atrás das portas.
Archibaldo,EXCELENTE!
ResponderExcluirMulheres e Homens Somos Complementares em Nossas
Relações Humanas,Afetivas,Prissionais,Sociais...
Enfim,Se Assim Fosse...Não Acumularia 'Pó eiras'
e Outras 'Coisitas Más...'
Parabéns e Grande Abraço!
Eu Sou,Joana D'Arc Valente Santana