sexta-feira, 30 de abril de 2010

O esquecimento popular é um porão amplo

Após 12 anos de governo da Frente Popular do Acre, o senador Tião Viana descobriu que é preciso combater a pobreza. Candidato a receber uma pensão vitalícia de mais de 20 mil reais por mês, como já ocorre com o irmão Jorge Viana, Tião prega agora que é preciso diminuir as diferenças entre pobres e ricos. Considerando que uma aposentadoria régia e inconstitucional paga pela previdência estatal a um grupelho de afortunados é um acinte à economia popular, bem que o senador poderia incluir em sua plataforma política a extinção da excrescência acalentada no governo do irmão.

Tião se elegeu a primeira vez para o Senado prometendo saúde de primeiro mundo e a segunda negando a autoria da própria promessa. Geração de empregos e construção de casas populares também já fizeram parte de um amplo cardápio político agora resumido na promessa de socializar a abastança.

“Pés no chão e mãos dadas para uma nova caminhada” foi o slogan escolhido para a apresentação dos candidatos da FPA, nesta sexta-feira, no Parque das Acácias. Parece coisa de quem estava com a cabeça na lua e mais parado que poste. Em relação a tudo que não foi feito para diminuir a distância entre ricos e pobres, essa interpretação não se constitui em exagero.

O tema político escolhido para anabolizar a candidatura de Tião Viana ao governo do Acre soa como alarido de opositor de longa data. É como se o pré-candidato não tivesse feito parte, todo esse tempo, de três governos que foram decisivos para aprofundar o fosso das diferenças sociais.

Mas isso não deve preocupar o petista. Ele sabe que o esquecimento popular é um porão capaz de abrigar todas contradições alheias e as promessas não cumpridas.

A gente ainda chega lá

VEREADOR DO MARANHÃO MANDA DETER E ALGEMAR JORNALISTA QUE COBRIA SESSÃO DA CÂMARA

Estelita Hass Carazzai, da Agência Folha

O jornalista Edmundo Moreira da Silva, 53, foi algemado e detido por guardas municipais durante uma sessão da Câmara Municipal de Timon (MA), anteontem à noite.

Ele e o cinegrafista Magno Ferreira, 27, acompanhavam a votação de um projeto que efetivava os 350 agentes de saúde do município. Os dois trabalham para o site Portal Hoje.

Enquanto aguardavam o início da sessão, dois guardas municipais abordaram os jornalistas e disseram que eles teriam de se retirar por não terem autorização do presidente da Casa, vereador Antônio Borges Pimentel, para filmar o evento.

"Disseram que faz parte do regimento interno da Câmara, mas nunca antes haviam nos incomodado com isso", diz Silva. Segundo ele, nas outras sessões em que levou a filmadora, ninguém foi solicitado a desligar o equipamento.

Diante da negativa em sair, Silva foi detido à força, levado para um camburão e de lá para a delegacia, onde foi autuado por desacato à autoridade.

Segundo a assessoria de imprensa da Câmara de Timon, o jornalista foi detido porque "alterou a voz" e falou "palavras de baixo calão" aos guardas.

A cena pode ser vista em um vídeo na internet. O jornalista, elevando a voz, afirma que está trabalhando "numa casa pública" e que não vai sair, ao que o guarda municipal responde: "Cala a boca, rapaz". A confusão aumenta e Silva é agarrado, algemado e arrastado para fora, diante dos gritos do público.

A Folha telefonou para o comandante da guarda municipal de Timon, mas seu celular estava fora da área.

Segundo a assessoria da Câmara, os jornalistas são solicitados a desligar as câmeras de vídeo "sempre que possível". "Eu sou só um. É complicado dar conta de tudo", afirma o assessor Walber Júnior.

O Sindicato dos Jornalistas do Piauí divulgou nota de repúdio pela agressão.

Veja o momento da prisão.

Diatribe disfarçada de argumentação


Um dos pressupostos que se escondem por trás da acusação de que alguém argumenta com ódio é que essa argumentação é falha pela carga sentimental que transporta. O outro pressuposto é que o interlocutor que identifica a virulência alheia goza do equilíbrio necessário a todo debate civilizado. O deputado Moisés Diniz (PCdoB-AC) recorre a esse truque na tentativa de desqualificar a opinião de dois renomados jornalistas. O pecado mortal de ambos foi comentar a lista da revista Time que elenca as cem pessoas mais influentes do mundo, entre as quais o presidente Lula.

Moisés cita artigo reproduzido aí abaixo, no qual não há, a meu ver, a carga de ira detectada por ele contra o seu guru Luiz Inácio. E sob a desculpa de que Reinaldo Azevedo, da revista Veja, e Paulo Nogueira, da Época, destilam veneno contra o petista, é o próprio Moisés Diniz quem desce do altar para inocular o vírus de sua diatribe contra os que ousam falar mal do intocável presidente.

Moisés chama os jornalistas de "carimbados coroinhas dos políticos da velha oposição". E trata Reinaldo Azevedo como "um troglodita da Revista VEJA". Chama ainda a atenção para "a quantidade de veneno que ele (Reinaldo) destila contra o líder operário que jogou para escanteio o professor de Harvard, Fernando Henrique Cardoso". Ambos - Reinaldo e Paulo Nogueira - precisam, na opinião do doce Moisés Diniz, de "um banho de sal grosso em todo esse rancor".

E até mesmo a porção democrática do deputado é carregada de tintas sombrias: "Nós respeitamos as suas opiniões, mesmo que sejam preconceituosas, com o seu velho odor de cemitério".

E para arrematar o discurso, ele recorre a uma falácia conhecida como argumentum ad numerum, que consiste em afirmar que quanto mais pessoas acreditam numa proposição, maior será a probabilidade de que ela seja correta. Segundo o argumento de Moisés, Lula é o cara porque apenas 18% dos eleitores deste país o rejeitam.

Faltou lembrar que a História está cheia de exemplos de como as multidões podem ser inconsequentes.

*A caricatura usada neste post foi publicada na Veja e no site http://baptistao.zip.net/.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Convém não esquecer que Hitler e Stálin foram Homens do Ano da Time

Por Paulo Nogueira, da revista Época

Notei, no twitter, um alarido em torno da presença de Lula na lista das 100 pessoas mais influentes do mundo feita anualmente pela Time. Havia um certo entusiasmo na fileira dos petistas e alguma raiva entre os que acham que depois de oito anos no poder já é tempo de o PT voltar à oposição.

O fato é que nem o entusiasmo e nem a raiva se justificam.

Listas não são mais nem menos que isso mesmo: listas. Os leitores gostam. São interessantes, geram discussões, animam conversas de bar. Os editores satisfazem alegremente a sede de listas da clientela. Só que têm que preenchê-las. Não é fácil. Sobretudo em casos como o da Time, com 100 nomes a cada ano. (O editor da revista explica num vídeo como foi feita a lista.) Você tem que promover rotatividade para que ela não se torne maçante. Chávez entrou em 2005 como uma liderança forte na América do Sul.

Nas edições seguintes, você não vai repeti-lo. Mas alguém da região tem que entrar, ou a lista ficará com ares elitistas. O presidente do … Peru? Bolívia? Uruguai?

Alguém falou no Equador?

Lula demorou para entrar nessa lista, feita há seis anos. Não havia motivos para que Chávez o precedesse. Mas ele não aumentará e nem diminuirá com sua inclusão no grupo dos 100. Lula é o que é. Um bom presidente, pragmático, inteligente. Cara boa, fácil comunicação com o povo. É, claramente, um facilitador, talvez sua maior virtude. Parece capaz de ver a floresta em vez de se demorar nas árvores, outra qualidade.

Sai do Planalto como um homem que, para usar a linguagem corporativa, cumpriu as metas sem, no entanto, ultrapassá-las. O Brasil em sua gestão ficou muito para trás da China e um pouco atrás da Índia.

Nota 7 para Lula. Dá para passar de ano sem exame, mas não vai receber chapéu de gênio.

Fernando Henrique leva um ponto a mais pela vitória histórica contra a inflação. Ah, mas ele não entrou na lista da Time, alguém poderá dizer. Sim, é verdade. Mas o fato é que essa lista começou a ser feita apenas em 1999, no final da era FHC. Se existisse há mais tempo, quando mas não fosse para ajudar a preenchê-la, FHC entraria fatalmente nela, e talvez a utilizasse depois para aumentar o cachê de suas palestras.

No mais, a Time é a mãe das revistas semanais de informação, e sua excelência é globalmente reconhecida. Mas suas escolhas de personalidades influentes às vezes são inacreditáveis. O Homem do Ano de 1939 foi Hitler. Hitler já publicara fazia tempo Mein Kempf e matara dezenas de milhares de pessoas a essa altura. Mesmo assim, foi o Homem do Ano. Três anos mais tarde, foi a vez de Stálin ser escolhido O Homem do Ano. Se você juntar as mortes provocadas por esses dois Homens do Ano chegará à casa de 60 milhões.

Lula, por tudo o que foi dito, demorou para entrar na lista dos 100 da Time. Mereceu.

Mas não é o caso de rojões dos seguidores e nem de lágrimas dos oponentes.

Em vez de comemorar ou chorar, é melhor voltar ao trabalho, porque o Brasil tem que dar duro para encurtar a distância que o separa de outros países, notadamente a China.

Brasil é o líder em desmatamento mundial, aponta levantamento

Afra Balazina e Andrea Vialli, do jornal O Estado de S. Paulo



O Brasil foi o País que mais perdeu áreas de florestas entre 2000 e 2005, aponta estudo divulgado ontem pela PNAS, publicação oficial da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos.

No período foram desmatados 165 mil quilômetros quadrados de floresta, o equivalente a 3,6% das perdas de florestas no mundo todo. O segundo país que mais perdeu florestas foi o Canadá, com o desmate de 160 mil km². A ação do homem e desastres naturais são as principais causas da perda de florestas.

No mundo todo, a cobertura vegetal diminuiu 3,1% entre 2000 e 2005. Foram 1,01 milhão de km² desmatados, o que sugere crescimento de 0,6% ao ano.

O estudo se baseou em observações por satélite de pesquisadores das Universidades de Dakota do Sul e do Estado de Nova York.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

O clamor das ruas



Parentes do garoto Fabrício Costa, vítima da criminalidade galopante, participaram de protesto nesta quarta-feira pelas ruas do centro de Rio Branco. As famílias pedem um basta à onda de violência para a qual as autoridades de Segurança Pública do Acre não conseguem dar respostas.

Um dos cartazes avisa ao governador Binho Marques sobre a realidade de quem não conta com policiamento 24 horas por dia. Em dezembro se esgota o prazo estabelecido pelo próprio governador para transformar o Acre no melhor lugar da Amazônia para se viver. Até lá certamente tombarão outros inocentes como Fabrício e Cabral Silva, este último vítima da também gravíssima violência no trânsito.

A imagem aí acima é do repórter fotográfico Dhárcules Pinheiro.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Liberdade assegurada

Coronel Paulo Cézar

Causou-me surpresa a informação de que a matéria que estava sendo produzida pela repórter Ana Paula Batalha não tenha sido publicada pelo jornal A Tribuna, conforme a própria repórter havia adiantado no momento em que lhe concedi a entrevista.

Respondi a cada uma de suas perguntas sobre a reunião da qual havia participado no clube de cabos e soldados a respeito dos interstícios nas promoções e até sugeri que ela ouvisse os responsáveis pela convocação e organização do evento. Solicitei em seguida que eles fossem até o jornal A Tribuna prestar os esclarecimentos necessários, a fim de que não pairasse dúvida sobre a pauta e os objetivos do encontro. Quanto ao fato da matéria não ter sido publicada, sinceramente não me diz respeito.

Lamento que a situação tenha tido tal desdobramento, ao ponto do jornalista Fábio Pontes fazer referência no jornal A Gazeta a um passado de triste memória como sendo algo ainda praticado em nosso Estado.

Felizmente, a liberdade com que cada jornalista se manifesta para expressar seu ponto de vista sobre este e outros episódios não deixa margem para dúvidas: se não houvesse respeito à liberdade de opinião em nosso Estado, certamente os jornalistas não escreveriam com tanta altivez, apesar de alguns equívocos, sobre o que pensam das autoridades.

O fato é que não fiz qualquer contato com a direção ou editoria do jornal para pedir que a matéria não fosse publicada. Continuarei a prestar o meu serviço no combate ao crime e em defesa da segurança das pessoas, com a mesma postura de respeito e consideração com os profissionais da imprensa, porque sei que eles estão fazendo sua parte no esforço diário de manter a sociedade informada.

*Paulo Cézar é subcomandante da PM do Acre

Comento
O coronel Paulo Cézar tem neste blog o espaço também assegurado ao jornalista Fábio Pontes. O presente texto foi encaminhado aos veículos de comunicação em resposta à celeuma criada a partir das declarações da jornalista Ana Paula Batalha.

Gostaria de destacar o trecho em que o oficial militar se refere à liberdade de imprensa que imagina existir no Acre. Para tanto ele recorre à "altivez" com que os jornalistas (alguns, ressalte-se) se referem às autoridades do estado. Imagino que do ponto de vista militar a altivez seja uma grave transgressão à hierarquia, pelo que se percebe do que foi escrito pelo Sr. Paulo Cézar. Uma rápida consulta ao Houaiss revela que o vocábulo tem duas acepções: 1. Sentimento de dignidade, brio, nobreza. E 2. Atitude de arrogância, soberba e intolerância.

Apesar do que diz o coronel, o exercício da livre expressão se encontra cerceado pelo governo da floresta há mais de uma década no estado. E não é altivez de meia dúzia (exercida sobretudo em twitters e blogs) que mudará essa realidade.

Jornais só noticiam o que é conveniente para o pessoal da Frente Popular. Basta atentar para o detalhe de que acontecimentos comezinhos, mas de interesse do governo, virarem manchetes em todos os diários ao mesmo tempo. E que denúncias graves e de interesse público quase sempre amargam a indiferença dos veículos de comunicação. Isso, claro, não significa um juízo de valor sobre os fatos relatados pelo militar. São questões distintas, reconheço.

Mas a conclusão de que Paulo Cézar supostamente recebe tratamento altivo e injusto por parte de dois jornalistas não remete à premissa de que a imprensa goza de liberdade. Esta última é falsa, ainda que a conclusão possa ser verdadeira em todas as suas nuances.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

De volta aos porões

Por Fábio Pontes, do jornal A Gazeta

O Acre é um Estado que a cada dia chama a atenção do Brasil e do mundo. Após tantos anos de sucateamento e desmandos cometidos pelos mandatários, aos poucos o Acre começa a se desenvolver econômica e democraticamente. Mas, infelizmente, aqueles “anos de chumbo” pelos quais os acreanos passaram, deixou seus herdeiros que insistem em achar que o Acre é, desculpe a expressão, a “casa da mãe Joana”.

No alvo deles está a liberdade de imprensa. E o mais triste é que o ataque vem de um setor que sempre foi hostil com a atuação livre dos jornais: os militares. O caso mais recente aconteceu neste final de semana. Com base em uma denúncia protocolada junto à Procuradoria Regional Eleitoral, a jornalista Ana Paula Batalha produziu uma reportagem que vinculava o subcomandante da Polícia Militar, coronel Paulo César, a fazer campanha política dentro da corporação a favor de candidatos petistas.

Após averiguar e ouvir ambos os lados, como reza o bom jornalismo, Ana Paula teve a notícia de que policiais militares, supostamente a mando do subcomandante, foram ao jornal com ameaças intimidadoras, recomendando a “ter cuidado caso a reportagem fosse publicada”. Ora, que cuidado seria este? Antes disso, uma comissão formada por sargentos procurou a jornalista para defender seu superior e desmentir que Paulo Cesar estaria pedindo votos.

Certamente esse grupo de militares foi por livre e espontânea pressão. O caso é triste para a história de uma população que tanto sofreu nas mãos de coronéis que atropelavam todos os princípios da democracia e faziam Justiça com as próprias mãos. Além disso, o episódio nos faz lembrar os anos em que as redações dos jornais eram invadidas por policiais a mando de autoridades insatisfeitas com a publicação de reportagens que denunciavam os abusos.

Há casos até de jornalistas que foram obrigados a engolir literalmente o jornal impresso. Queremos isso de volta? A sociedade disse que não quando, legalmente, condenou no final do ano passado, mais uma vez, o ex-chefe do esquadrão da morte. A sociedade não aceita mais esse retrocesso. Se o militar se sentiria prejudicado com a publicação da matéria, ele poderia usufruir de todos os trâmites oferecidos pela Justiça brasileira.

Um policial militar deve zelar pelo cumprimento da Constituição Federal, que tem a liberdade de expressão como um dos princípios e direito sagrado dos brasileiros. A Polícia Militar hoje é outra, e não aquela do governo dos generais. Um exemplo disso é o próprio comandante da Polícia Militar, coronel Romário Célio, que sempre atendeu e respondeu aos questionamentos da imprensa sem jamais mandar seus homens invadir o local de trabalhos dos jornalistas.

*Fábio Pontes é jornalista de A Gazeta. Este artigo foi extraído da edição que circula nesta terça-feira.

Seria ótima se não fosse inútil

A deputada federal Perpétua Almeida (PCdoB) quer enfiar no Código de Trânsito Brasileiro a convenção existente em Brasília segundo a qual os motoristas param o veículo todas as vezes que um pedestre, diante de uma faixa, estende o braço a frente do corpo. A idéia seria ótima se não fosse inútil.

Explico por quê.

Leis existem para regular o comportamento social, não é verdade? O comportamento exemplar dos condutores de veículos da Capital Federal foi determinado, ao longo de muitos anos, graças a campanhas educacionais intensas e pesadas punições impostas aos infratores. Dizem até que estas últimas tiveram eficácia muito maior que as primeiras.

O gesto que faz os motoristas brasilienses frearem o carro não estaria regulado pela ação de causa e efeito não houvesse, subjacente a ele, a consciência necessária para isso. O que determina que os motoristas pisem no freio ante um pedestre com o braço estendido não é o gesto em si, mas o grau de civilidade daqueles.

Esse grau foi atingido pela imposição das regras de trânsito entre as quais não consta o gesto do braço estendido. Este passou a ser uma mera convenção. E essa convenção não terá efeito onde não houver o substrato necessário à sua validação.

A deputada Perpétua Almeida, com toda sua experiência parlamentar, deveria saber que já temos leis demais no País. O que nos falta é colocar em prática as já existentes.

sábado, 24 de abril de 2010

O Acre que eles tentam esconder

"A gente sente que o que mais falta nessas comunidades é educação, o trabalho de educação mesmo"

Guilherme Yamashita, médico do Navio Hospital Dr. Montenegro, sobre a amarga realidade dos ribeirinhos do Juruá mostrada no Globo Repórter de ontem a contragosto dos que falam e agem como se não existissem miséria e analfabetismo no Acre.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Diário da empulhação


Os jornais do Acre circulam hoje com mais um episódio da saga de Jorge Viana e Edvaldo Magalhães no interior – dessa vez pela região do Alto Acre. Não há novidade ou interesse jornalístico que justifique tanta publicidade em torno daquilo que a população já se acostumou a ver em período eleitoral: os abraços de sempre, os sorrisos iguais e os discursos retocados para dar a impressão de que são diferentes.

Até mesmo o redator do release, extenuado talvez de ouvir as mesmíssimas coisas e assacado pela obrigação de dar ao trivial o caráter definitivo da originalidade, deslizou na língua pátria e tratou de chutar o traseiro da lógica. Nada muito grave, tudo muito desculpável. A começar pelo subtítulo do texto, que diz:

"Berço da luta pelo meio ambiente no Estado, os dois políticos ouvem conselhos da comunidade". Aqui.

Pelo que está dito, Jorge e Edvaldo é que são o berço da luta pelo meio ambiente no estado. Sei, o redator se referia a Brasileia e Xapuri, e não aos dois políticos. Mas embaralhou os fatores, acanalhando o produto.

Já na abertura do release está escrito que “Sem o protagonismo dessas duas cidades o projeto que se desenvolve no Estado na última década não existiria. A afirmação é forte, mas os neologismos Florestania e Desenvolvimento Sustentável...

E desde quando desenvolvimento sustentável é neologismo?

Após 12 anos de logro e muita lengalenga, não falta a essa gente apenas o que falar. Falta-lhes competência até para resumir a empulhação.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Amores perigosos

“O ano de 2009, (sic) foi um ano em que a violência em todo país cresceu, sobretudo o roubo a mão armada e aqui no Acre não foi diferente”, disparou o redator adestrado da Secretaria de Segurança Pública do Acre (Sesp). A redação claudicante consta de uma resposta dada pela Sesp ao deputado Donald Fernandes (PSDB), que requereu os dados da criminalidade galopante. Ao invés daqueles, o parlamentar recebeu uma nota técnica com algumas justificativas e quase nenhuma informação.

Não é a primeira vez que o tucano solicita informações públicas e em troca lhe dão platitudes. Foi assim quando quis averiguar pagamentos supostamente irregulares a membros da Procuradoria Geral do Estado. Parece que será novamente assim quanto ao pedido sobre os gastos com aposentadorias de ex-governadores, essa excrescência inconstitucional ressuscitada no governo de Jorge Viana.

Viramos um grande feudo dos petralhas. Informações públicas já não são de domínio público, senão quando interessam ao delírio esquizofrênico dos que prometem transformar o Acre numa Finlândia brasileira – não obstante os índices sociais em níveis africanos. Por aqui, tudo que é ruim dorme nas gavetas.

Não satisfeitos em escamotear a realidade, os autores do documento enviado ao deputado Donald exageraram nas referências às ações do governo, penetraram no caminho pantanoso da sociologia criminal e desembocaram nas obviedades de sempre. Cito uma: o agravamento da criminalidade é resultado do aumento do tráfico de drogas e “da expansão de sua comercialização em decorrência do baixo custo do entorpecente”. Evidente, não é mesmo?

Diz ainda a nota da Sesp que, diferente de outros estados, aqui o que “impulsiona a prática de crimes contra a vida são os fatores passionais”.

No Acre, até o amor ficou perigoso.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Sobre imprecisões verbais e fenômenos (paranormais?)

A interdição da ponte sobre o rio Caeté, em Sena Madureira, rende um debate filosófico. Sei que filosofia é o menor dos desejos dos moradores daquele município nesse momento de crise. Mas a mãe de todas as ciências pode explicar muitas coisas. Só não explicará, por certo, a condução do caso à paranormalidade, como parece preferir o governo do Acre. Mas vamos por partes para que o entendimento seja completo.

Nesta terça, o petista Ney Amorim e o tucano Mazinho Serafim ignoraram uma máxima de Voltaire e engataram, na Assembleia Legislativa, um debate xucro - e o adjetivo nada tem a ver com as razões da porfia, senão com o modo como ela se desenrolou. Voltaire, o filósofo francês, disse o seguinte: "Se você quiser conversar comigo, defina seus termos".

Antes de prosseguirmos é preciso explicar que a ponte do Caeté custou mais de 10 milhões de reais aos contribuintes. No dia da inauguração, os petralhas fizeram festa e brindaram os populares com os discursos ufanistas e a pirotecnia de sempre.

Voltemos aos deputados. Serafim acusou o governo de incompetência, o diretor do Deracre de ter dito que quem não tiver barco que trate de atravessar o rio a nado e o local, com a interdição, de ter virado um caos. É claro que o parlamentar tucano exagerou ao empregar essa última expressão. Pode haver, entre os moradores de Sena Madureira, aborrecimento, algum prejuízo e muito transtorno. Caos, não.

A contraparte petista no debate resolveu emprestar novo sentido à prosa adversária. E disse que caos haveria se a ponte houvesse caído. E que, assim, o colega tucano mentia porque ela ainda está de pé. Ora, ora, dona Aurora, o deputado Ney Amorim certamente é conhecedor da dialética erística de Arthur Schopenhauer, autor de um livro chamado "Como vencer um debate sem precisar ter razão".

Razão o petista Ney Amorim está longe de ter, por isso, mais do que nunca, era preciso vencer o debate. E assim ele lançou mão de um dos ensinamentos do livro de Schopenhauer, a chamada "ampliação indevida", que consiste em levar a afirmação do adversário além de seus limites e exagerá-la. Serafim não disse que a ponte havia desmoronado, mas que lá reinava o caos. O caos, replicou Amorim, seria a obra ter caído, por isso atribuiu à afirmação adversária uma designação que ela passou a ter apenas a partir de sua interpretação sobre o que fora dito.

Bastava terem as partes seguido o conselho de Voltaire para que o trem semântico fosse recolocado nos trilhos do entendimento. Mas nem sempre a clareza é a melhor estratégia de quem faz a defesa do governo estadual. Na página deste último na internet, longe de admitir que houve erro na construção da ponte, optou-se por evocar uma "movimentação no solo" para justificar o problema. O texto prossegue dizendo que "a causa do fenômeno ainda não é conhecida, mas o laudo técnico será entregue o mais rápido possível pela equipe que está trabalhando no local".

Se o fenômeno for metafísico, o ex-deputado Marcos Afonso, líder de um grupo de afeiçoados à filosofia que se reúnem aos sábados na Biblioteca da Floresta, poderia ser chamado a dar seus palpites. Caso alguém desconfie de que a coisa está no âmbito da paranormalidade ou do espiritismo, aí é o caso de se apelar ao Padre Quevedo ou a Chico Xavier desencarnado.

Mas seja ou não deste mundo o fenômeno que causou o dano à ponte do rio Caeté, a solução certamente sairá, mais uma vez, do bolso do contribuinte.

Cruzada comercial acreana na China - aguardemos

Por Valterlúcio Campelo

Noves fora a linguagem ufanista, beirando a pieguice, que jornais e jornalistas estão utilizando para propagandear a visita da comitiva acreana à China, considero importante e necessário que tenha ocorrido. O problema está no enfoque de mão trocada. Explico.

Sem essa de "prospectar mercado para os produtos acreanos", por favor. Que produtos? Quase cem por cento do que se produz é madeira, castanha e carne. Fora disso, nada é economicamente relevante. Não precisaria ir a turma toda pra saber se a China precisa desses produtos, não é mesmo?

Do jeito que estão falando, parece que fomos lá perguntar quais entre os produtos acreanos a China precisa importar. Isto é falso. A verdadeira pergunta é: Quais produtos a China precisa que possamos, talvez, vir a produzir? Se o pessoal voltar com uma listinha razoável de uns cinco ítens já é algo a se comemorar, pois dada a dimensão da sua economia qualquer demanda chinesa pode significar a retirada do Acre da estagnação crônica. Isto se a turma do "não mexe" deixar.

Para desilusão de alguns, garanto que a China não parou para ver os acreanos vendendo, mas aposto que o Acre vai parar pra ver os chineses por aqui comprando. O quê, ainda não sei. Aguardemos o retorno de nossa cruzada comercial.

Campelo é autor do blog Valterlúcio COMENTA.