Pouparei os leitores da cansativa e imprópria tarefa de traçar as inúmeras diferenças entre a novelista e o homem de letras. Direi apenas que o escritor modernista foi um dos brasileiros mais preocupados com a cultura de sua gente, enquanto a preocupação maior da Sra. Perez parece ser com a pontuação de suas novelas no Ibope.
Convidaram-me para uma palestra dela, que ocorreu na noite desta terça-feira. Declinei. Já estive em uma de suas explanações, um original do romance "Amazônia dos brabos" debaixo do braço, para ouvir, no meio da conversa, que não adianta aos candidatos a escritor entregarem suas tentativas literárias aos veteranos - porque eles simplesmente não leem. Achei que ela falava diretamente a mim, o rosto afogueado pela repreensão intempestiva. Pensei em sair de fininho ao final da preleção sem entregar-lhe os originais do meu livro, mas fui dissuadido por um colega de trabalho, conhecido da novelista.
Glória Perez não é Mario de Andrade sobretudo porque este não ignorou os originais do primeiro livro de Fernando Sabino. Da intensa correspondência entre os dois, nascida da ousadia do jovem de 19 anos, que enviou um exemplar ao já maior nome da literatura nacional, nasceu um livro chamado "Cartas a um jovem escritor e suas respostas".
Quando li esse livro, muitos anos atrás, ainda não conhecia Glória Perez. Agora que a conheço, só penso na correspondência entre os dois escritores quando ouço alguma menção ao nome dela. Nas cartas que o consagrado Mario enviava ao pupilo havia importantíssimos conselhos sobre a arte de escrever. De Glória Perez, apesar dos originais que lhe entreguei, nunca recebi um e-mail sequer.
Alguém dirá que se Glória Perez não é Mario de Andrade, eu tampouco sou Fernando Sabino... Mas não é disso que trata este texto. Fala-se aqui de solidariedade, altruísmo, fraternidade e desapego - coisas que parecem extintas no ser humano moderno, independente da profissão que ele exerça. E quanto mais bem sucedido ele for, mais egoísta será.
Novelista visa apenas o lado mercadológico estipulado pelos índices de emissoras de TV, de forma que as obras desta autora oscilam ao sabor do que o público quer, é o que chamam de 'obra aberta' ou seja não tem valor cultural algum. Não é à toa que ela é criticada por abusar da chamada 'licença poética': é alguém em Dubai falando português e sendo prontamente atendido, é um fato cultural transformado em modismo, é mocinha egocêntrica e chata com nomes de cachorro... Romancista e escritor por sua vez concebem algo que vai ser lembrado por sua qualidade ou atemporalidade, portanto, caro Archibaldo você está inserido nesta categoria, sem nenhuma demagogia. A única vez que Glória se redimiu comigo foi ao 'costurar' os entrechos da macrossérie que contou um pouco dessa saga que é ser acreano, "Amazônia - De Galvez a Chico Mendes", digo 'costurar' porque nada ali veio do intelecto dela, mas baseado em livros muito bons (Seringal e Terra Caída) e extensa pesquisa de seus colaboradores, colaboradores estes que ela jamais cita, aliás. Quer saber de uma coisa? A Globo faz um mal danado aos neurônios.
ResponderExcluirAinda não tive a chance de ler o "Amazônia dos brabos". Devo estar por fora dos lançamentos literários. O último em que estive foi no do "O amor é trágico, ame!", do Stélio. Como faço para adquirir esse teu?
ResponderExcluirÀ exceção de "Amazônia" (grande minissérie, por sinal), mas que foi feita com base em obras de outros autores - diga-se de passagem ai dela sem os colaboradores), os demais trabalhos de Glória Peres são apenas... novelas. E telenovelas. Há quem afirme que se trata se sub arte (existe sub arte?). Ou arte menor (existe arte menor?). Importante ressaltar que Glória não é e jamais será uma literata. É sim, uma "artista" de mercado. Aborda temas diametralmente opostos e realidades tãos distintas que beira ao delírio. Exemplo disso são Barriga de Aluguel, O Clone e Caminho das Índias, em que se forçou uma interação irreal e/ou intercultural que teve o mérito apenas de levar ao público temas atuais e a amostragem dos antagonismos culturais que permeiam a humanidade. Não mais que isso. Numa época em que a bíblia e o alcorão se defrontam, isso é saudável. Agora, "Amazônia dos brabos" eu li e gostei muito. Não tem nada de surreal, pelo contrário.
ResponderExcluirQuerido Marcio Chocorosqui, dos cinco mil exemplares da única tiragem do livro, me sobrou apenas um. Recebi poucos mais de 30 unidades, todas distribuídas gratuitamente, como sucedeu às demais. Posso emprestá-lo, se você quiser.
ResponderExcluirAbraço.
Ok! Estou de férias. Quero incluí-lo na minha lista de leitura. Que tal uma sinuca no Cowboy para tratar disso?
ResponderExcluir